21 abril 2009

Alice me disse...


Alice* é uma menina bonita. Bonita no conceito de quem? Bonita para os pais, para os amigos, para o namorado ou para a sociedade? Alice é bonita para mim, e isso deveria fazer com que ela ficasse satisfeita. Mas a pobre menina se acha feia. Não se acha digna de ser amada, tem pena de si mesma e com isso, querendo ela ou não, acaba atraindo sentimentos de pena dos outros.
Mesmo não tendo um boletim exemplar, Alice se esforça, Alice estuda sim! Deixa de sair pra enfiar as fuças nos livros sim! Ninguém acredita em Alice, ninguém acredita que ela tem capacidade de um dia ser uma grande arquiteta, uma grande ‘Niemeyer’ na sua mente.
Esses amigos de Alice, a atrapalham com esses comentários fúteis, com esses comentários invejosos e cheios de raiva por não terem a capacidade da menina que eles julgam ser burra. Isso acaba fixando no cérebro dela sim! Isso acaba afetando o sistema emocional dela sim! Porque nós não ajudamos Alice? Porque deixamos Alice se influenciar com comentários, conselhos, bedelhos e pitacos na vida da menina? Não devemos aprisioná-la num mundinho de fadas e duendes e que nesse mundo tudo será 100% mágico e feliz. Devemos sim alertar-la sobre qual profissão seguir, sobre suas tendências, seus gostos e suas áreas especificas. Nada de jogá-la para baixo! Ela não agüenta mais ouvir piadinhas de estrupícios que tem dinheiro e pagam para passar de ano, enquanto se mata de estudar, estudar, estudar e só ouve piadinhas e brincadeiras sobre sua capacidade, o que a deixa mais confusa.
Até mesmo os pais e a família de Alice a deixam triste. Inúmeras vezes ela tem que ouvir palavras frias, cruéis, palavras vomitadas de seu pai, Eduardo*.
Eduardo é um homem bom, tem um ótimo caráter e nunca iria contra a filha se soubesse que ela estava certa. Porém, Eduardo vem de uma família de 11 irmãos, todos italianos chegando ao Brasil juntamente com seus pais (avós de Alice) durante a 2 Guerra Mundial. Os avós de Alice falavam italiano fluentemente, claro, era a língua materna deles. Porem não sabiam português, desconheciam a terra que seria o novo lar para o resto da sua linhagem. O que pode ter gerado um grande impacto, uma grande pressão sobre os problemas financeiros que passaram ao longo de suas vidas, causando assim um trauma na vida de Eduardo, que tem como pensamento: ‘Se ele foi ‘miserável’ Alice não teria problema nenhum em ser também’. Que se Eduardo foi um ótimo aluno mesmo com pais analfabetos no português, Alice poderia e deveria ser uma aluna mega exemplar, até mesmo por não ter 10 irmãos como seu pai teve. Infelizmente, Eduardo não entende que as gerações mudam que a sociedade muda, que os costumes mudam, e que conseqüentemente seu passado de 1957 até 2009 já mudou bastante em relação ao passado de sua filha Alice, nascida em 1992.
Alice tem orgulho de seu pai sim! Embora Eduardo ache que Alice sinta vergonha dele, que Alice só ficara feliz quando sair de casa, não é nada disso! Alguma vez Eduardo já se sentou para conversar com Alice sobre isso? Alguma vez ele se interessou sobre os sentimentos da filha? Alguma vez ele compareceu ao colégio da filha? Não! Mas não é por causa disso que Alice ‘odeia’ o pai como ele mesmo acha.
Eu conversei com Alice e Alice me disse tudo! Disse que ama o pai, que sente muito orgulho de ele ter conseguido vencer na vida com o próprio trabalho, com o próprio suor, sente orgulho de hoje o seu pai estar empregado numa grande empresa e de ser um dos melhores trabalhadores de lá.
Alice me disse coisas incríveis sobre seu pai e sobre o quanto ela o ama, mesmo não sabendo demonstrar isso, mesmo quando Eduardo grita com ela, mesmo quando Eduardo da umas palmadas nela. Alice ama seu pai, sangue do seu sangue, e quem ela tanto parece fisicamente.
A mãe de Alice, sempre teve um temperamento bondoso. Alice sempre foi a princesinha da mamãe, ate os derradeiros anos de 2007, quando nossa protagonista entrou na fase mais conhecida como ‘aborrescencia’. Pobre Alice! Não sabia no que estava se metendo! Não sabia os desgostos que ia trazer para si mesma e para sua família! Pobre Alice! Ingênua e com bom coração, sempre fora uma aluna dedicada, e de repente, se rebelou contra o mundo. Alice só fez MERDAS, e merdas das grandes! Mas a pior merda que Alice possas ter vindo a fazer ao longo desses três anos, foi sem dúvida alguma: Machucar o tão bondoso coração de sua mãe, Luiza*.
Luiza veio de uma família igualmente humilde à de seu marido Eduardo. Ambos moravam nos arredores do Grajau e Alto da Boa Vista, agora esta terra é muito conhecida pelos morros e tiroteios. Igual a sua filha Alice, Luiza também era filha única, filha de pais igualmente humildes (os avós maternos de Alice). Luiza recebeu uma boa educação, praticava sua religião, respeitava os mais velhos, nunca deu trabalho aos seus pais. Estudava muito a coitada da Luiza! Como estudava! Alice me disse que quando ia visitar a casa de sua avó, o quarto que havia pertenciado à sua mãe, permanecia intacto, desde o dia em que Luiza casou com Eduardo e se fora para sempre da casa dos pais. Alice me disse que quando entrou no quarto, sentiu uma mistura de pena da mãe, e paixão pelo ambiente aconchegante que desfrutava (sem saber, pela ultima vez).
Tantos livros! Quantas estantes! Enciclopédias! Dicionários! Quantos livros de Química!
Química sempre fora a grande paixão da vida de sua mãe, Luiza, que estudou vorazmente para conseguir entrar na faculdade dos seus sonhos, Engenharia Química na super concorrida, UERJ.
Quando conseguiu entrar, ficou em 24 lugar de todo o vestibular! Alice ainda me disse também que se lembrava de sua mãe rindo e se divertindo na época quando relatava à filha, a surpresa de seus pais, tão orgulhosos ficaram!
Pelo que Alice me disse, o sonho de sua mãe era ser uma grande professora de Química, ou ate mesmo de matemática, matéria a qual Luiza tanto ama!
Mas nossos desejos nem sempre saem como nós pensamos.
Assim que terminou a faculdade e se formou em engenharia química, começou a trabalhar em laboratórios químicos, analisar compostos... Era o próprio sonho para Luiza!
Foi quando ela conheceu Eduardo, namoraram e ficaram noivos. 8 ou 10 anos de namoro, Alice me disse na época, mas agora eu não me lembro.
Logo depois veio o tão esperado casamento!
O dia mais feliz da vida dos pais de Alice, sem duvida alguma!
Mas, passado alguns anos, a mãe de Alice decidiu entrar numa faculdade que também era o seu sonho, e que ela estudou muito para conseguir: Direito na UERJ.
E Luiza conseguiu! Quando falou sobre esse assunto com Alice, Alice me disse que os olhos da mãe ficaram mareados e úmidos, prestes a brotarem lagrimas.
A mãe de Alice trabalhava de manha ate a noitinha, e a noite fazia a faculdade de Direto, o tão grande sonho de Luiza!
Já Eduardo, trabalhava em horário integral.
Tudo corria muito bem, apenas por um detalhe inesperado: faltando três períodos para se formar em Direito, Luiza descobriu estar grávida. E grávida de Alice!
Alice se sentiu culpada por muitos e muitos anos, pensava ter acabado com a carreira da mãe, pensava ter destruído seus sonhos, quando sua mãe se viu obrigada a trancar a faculdade faltando tão pouco tempo para o seu término.
Luiza não tinha mais condições de trabalhar integral, ir às aulas de direito à noite, subir e andar pela grande UERJ e ainda grávida. E com uma gravidez delicadíssima.
Porque Alice também me disse que antes de seu nascimento, sua mãe já havia perdido 5 filhos. E por isso o grau de delicadeza desse novo bebe que já estava a caminho era muito alto segundo os médicos.
Mas como Luiza achava que tudo tem uma causa e um certo propósito na vida, abdicou-se da sua carreira, de suas festas e de inúmeras outras coisas, se submetendo a ficar deitar em sua cama durante sete meses após a descoberta da gravidez.
Alice me disse que fica imaginando ate hoje que se fosse com ela, ela faria o mesmo ato de amor que a mãe havia feito.
Luiza se submeteu a costuras no útero sem anestesia por amor à Alice. Submeteu-se também a injeções que doíam na alma, segundo Luiza, tudo para Alice não nascer prematuramente e não vir a ter um final tão triste quando o de seus outros filhos já perdidos.
Mesmo depois de todos esses cuidados e muitos carinhos, sofrimentos e horas de abdicação do próprio prazer, para trazer ao mundo um novo ser, um novo bebe, uma nova ‘jóia’, nasceu Alice, muito saudável e prematura de apenas 10 dias.
Alice cresceu e foi se mostrando cada vez mais a cara do pai, Eduardo.
Não havia nenhum sinal de Luiza em suas feições, apenas o jeito de falar.
Alice me disse que não queria fazer de sua história um grande testamento, uma Bíblia.
Ela também me disse que se arrepende profundamente de todas as dores, magoas sofrimentos, e lagrimas que fez Eduardo e Luiza derramarem por ela.
Mas também Alice disse que não queria que essa nossa conversa virasse algo do tipo: ‘Por favor, tenham pena de minha amiga Alice’.
Nem sei como Alice autorizou a escrita resumida de um pouco da sua vida.
Sinceramente, Alice você é forte, você é corajosa, e nunca, nunca, nunca deixe que os outros, independentemente de quem sejam, ou do que significam para você, te deixem para baixo!
Alice! Esse seu sorriso é lindo!
Alice! Sua gargalhada contagia a todos!
Alice! Você é uma lutadora, você sobreviveu no ventre de sua mãe, você tem o direito de ser feliz!
Alice! Você tem talentos sim! Você e uma ótima atriz, uma ótima amiga! Você nunca foi mau caráter, ou fofoqueira! Você nunca agiu de má fé, Alice!
Espero sinceramente que todos que tenham lido esse breve resumo dos sentimentos de minha amiga Alice, das dores e emoções de seus pais, Luiza e Eduardo, pensem em como vocês andam tratando aqueles que vocês amam.
Porque eu amo muito essa MINHA Alice!
Amo mesmo, e não vou deixar que nada de ruim aconteça com ela!

* os nomes foram trocados por respeitos à privacidade das pessoas envolvidas no texto relatado.

6 comentários:

Mine disse...

Oi Rebeca!!!
Vim agradecer a visita carinhosa no meu blog,e dizer que virei fã,adorei o texto!!!
Sem falar que tbm AMO café,rsrsrs...
Linkei-te!
Bjs

Anônimo disse...

otimo blog

Majú disse...

Eu acredito na Alice... E sei que ela é muito mais do que aquilo que dizem que ela é. Sempre soube.

Majú disse...

Ah! Parabéns :)

Majú disse...

Ah, e você esqueceu um "Aurélio" da segunda vez que cita o pai... Você deve ter mudado de idéia em relação ao nome mas esqueceu-se de mudar esse. Só pra avisar :B

Anônimo disse...

Fiquei emocionada com seu texto.Lindo e de uma sensibilidade extrema.O mais importante foi a descoberta e a conclusão , que desde a concepção já somos vitoriosos ,afinal de milhões de espermatozóides só um vence.
Quando nascemos ,não nascemos por acaso e sim para desempenharmos alguma função ,função essa sonhada por DEUS para a nossa vida.Ninguém tem o direito de tirar nossos sonhos nem a nossa imensa importância ,pois somos únicos e insubstituíveis,vemos muito isso quando alguém que conhecemos se vai.
Se DEUS desejou a nossa vida, perguntemos a ele sempre,Senhor o que queres de mim?
Qual a minha tarefa nesse mundo?
Acho que assim encontraremos nossos caminho,companheiros/ras,amigos verdadeiros,a profissão certa e etc...
O erro é que sempre esquecemos de fazer isto ecometemos tantos enganos ,além de dar ouvidos à um bando de frustrados e invejosos que só nos põe para baixo.
Vá em frente ! Desde o inicio de sua vida está claro que você e sua amiga ALICE ,e outras que se acham tão inferiores nasceram para vencer.
Tenho total convicção disso.
Afastem-se de quem ás coloca para baixo,esses ou essas tem medo das suas capacidades e querem aprisioná-las com comentários pejorativos. pra MERDA com eles/elas!!!!!!